sexta-feira, 28 de outubro de 2005

Que Susto!

O homem é um ser que tem medo de parecer anormal. Por isso cria todo um conjunto de sinais para justificar atitudes que possam colocar em risco sua reputação. Um exemplo é quando se está com a boca cheia e alguém faz uma pergunta. Começa-se então a mastigar de uma forma mais enfática para deixar claro que o silêncio se deve à boca ocupada e não a um distúbio qualquer. Claro que essa mastigação pode assustar criancinhas e animais domésticos de pequeno porte. Mas isso é aceitável.

Um outro sinal que se emite para não parecer louco é dizer "que susto!". Sempre que alguém leva um susto diz "que susto!". Isso é para ficar evidente que o chilique e o grito não são rompantes de uma mente perturbada. E o "que susto!" resolve tudo.

Existe a situação contrária. Quando se faz uma loucura não se emite nenhum sinal. É preferível que ninguém perceba. Já viu alguém no trânsito dar seta antes de dar uma fechada?

sábado, 1 de outubro de 2005

Dona Helena

Helena Meireles foi considerada em 1993 pela revista americana Guitar Player como instrumentista-revelação. Essa mesma revista, pouco depois, a colocara na lista das 100 melhores palhetas do mundo de todos os tempos, ao lado de Jimi Hendrix, B. B. King e Eric Clapton. Eu, por ironia, a conheci através de um livro e não através da música. Ironia maior por ela ter sido analfabeta, logo, tão distante do mundo literário. O livro é de Rosa Nepomuceno, onde é dedicado um capítulo para a pantaneira. É difícil não se emocionar com a saga de Helena, mesmo resumida em poucas páginas.

Helena Meirelles deixou apenas 4 discos gravados. Só encontrei um à venda e estava em promoção. Queria ter pagado mais por ele. Queria ter a sensação de que ela estava sendo reconhecida. Mas Helena Meirelles custou apenas 9,90.

Hoje é a primeira vez que a ouço. O disco Flor de Guavira é um disco instrumental muito simples, como as coisas boas da vida. Em uma das faixas, na introdução, Helena fala sobre a música que será tocada. Seu relato singelo dá uma pista de sua pureza.

Helena morreu no último dia 29 aos 81 anos. Morreu como os mitos devem morrer, deixando apenas um pouco do que são. Por isso são mitos.


Nepomuceno, Rosa
Música Caipira: da roça ao rodeio
ISBN 85-7326-157-9