segunda-feira, 28 de julho de 2008

A Lua

Hoje é dia de lua cheia. O céu está limpo, cheio de estrelas e a lua bem em cima clareando tudo com sua luz suave e acolhedora. O caipira, sentado em um tronco tombado ao lado do ranchinho, com seu chapéu de palha sobre o joelho e pitando seu cigarro de fumo de corda, olha hipnotizado para o céu e seus olhos brilham tanto quanto jabuticaba madura em dia de chuva. Ao seu lado, um vazio deixado reservado para alguém que nem ele sabe direito quem é. Na solidão do coração do caboclo, a paixão fica pronta antes de ter alguém para amar. O sentimento fica à espreita esperando o dia chegar e então, se tiver coragem, se revelar. O caipira olha para trás e vê só sua sombra e só então se dá conta da solidão que lhe fere. A sombra é diferente da formada pela luz do sol agressiva, que queima quem acerta e finca o desenho por detrás no chão num contorno certo. A luz da lua, ao contrário, encontra o rosto marcado do caipira e desenha devagarinho uma sombra com seus contornos e a repousa sobre o chão, quase sem tocá-lo. O caipira suspira, engole seco com nó na garganta e a lua, em respeito a sua dor, se põe atrás de uma nuvem passageira. E volta para lhe fazer companhia logo em seguida. No silêncio absoluto, o caipira procura por sons filtrados durante anos de solidão. E começa a ouvir aos poucos o barulho das árvores balançando com a brisa da noite, as cigarras à procura de suas parceiras, as patas de seu cão tocando a terra num ir e vir por nada, uma manga caindo do pé, o cavalo se mexendo para espantar os mosquitos que atrapalham seu sono. De tão acostumado a tudo isso, o caipira já não os ouvia mais. Só ouvia o diferente. E o diferente, o que destoava ali, era raro. A solidão caipira ensurdece. Então, meio desconcertado, como se alguém estivesse de tocaia, dá uma pigarreada para se ouvir também. E se ouve e se reconhece naquele lugar. Agora sim, ele também existe em seu próprio mundo. O cão então pára com o barulho emitido pelo seu dono e, meio encabulado, dá um latido e abana o rabo timidamente. Agora, ele também se reconhece ali.

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